sábado, 4 de junho de 2016

A PRECE



Por Léon Denis

A prece deve ser uma expansão íntima da alma para com Deus, um colóquio solitário, uma meditação sempre útil, muitas vezes fecunda. É, por excelência, o refúgio dos aflitos, dos corações magoados. Nas horas de acabrunhamento, de pesar íntimo e de desespero, quem não achou na prece a calma, o reconforto e o alivio a seus males? Um diálogo misterioso se estabelece entre a alma sofredora e a potência evocada. A alma expõe suas angústias, seus desânimos; implora socorro, apoio, Indulgência. E, então, no santuário da consciência, uma voz secreta responde: é a voz d’Aquele donde dimana toda a força para as lutas deste mundo, todo o bálsamo para as nossas feridas, toda a luz para as nossas incertezas. E essa voz consola, reanima, persuade; traz-nos a coragem, a submissão, a resignação estoicas. E, então, erguemo-nos menos tristes, menos atormentados; um raio de sol divino luziu em nossa alma, fez despontar nela a esperança.
Há homens que desdenham a prece, que a consideram banal e ridícula. Esses jamais oraram, ou, talvez, nunca tenham sabido orar. Ah! sem dúvida, se só se trata de padre-nossos proferidos sem convicção, de responsos tão vãos quanto Intermináveis, de todas essas orações classificadas e numeradas que os lábios balbuciam, mas nas quais o coração não toma parte, pode-se compreender tais críticas; porém, nisso não consiste a prece. A prece é uma elevação acima de todas as coisas terrestres, um ardente apelo às potências superiores, um Impulso, um voo para as regiões que não são perturbadas pelos murmúrios, pelas agitações do mundo material, e onde o ser bebe as Inspirações que lhe são necessárias. Quanto maior for seu alcance, tanto mais sincero é seu apelo, tanto mais distintas e esclarecidas se revelam as harmonias, as vozes, as belezas dos mundos superiores. É como que uma janela que se abre para o Invisível, para o infinito, e pela qual ela percebe mil impressões consoladoras e sublimes. Impregna-se, embriaga-se e retempera-se nessas impressões, como num banho fluídico e regenerador.
Nos colóquios da alma com a Potência Suprema a linguagem não deve ser preparada ou organizada com antecedência; sobretudo, não deve ser uma fórmula, cujo tamanho é proporcional ao seu importe monetário, pois isso seria uma profanação e quase um sacrilégio. A linguagem da prece deve variar segundo as necessidades, segundo o estado do Espírito humano. É um grito, um lamento, uma efusão, um cântico de amor, um manifesto de adoração, ou um exame de seus atos, um Inventário moral que se faz sob a vista de Deus, ou ainda um simples pensamento, uma lembrança, um olhar erguido para o céu.
Não há horas para a prece. Sem dúvida, é conveniente elevar-se o coração a Deus no começo e no fim do dia. Mas, se não vos sentirdes motivados, não oreis; é melhor não fazer nenhuma prece do que orar somente com os lábios. Em compensação, quando sentirdes vossa alma enternecida, agitada por um sentimento profundo, pelo espetáculo do infinito, deveis fazer a prece, mesmo que seja à beira dos oceanos, sob a claridade do dia, ou debaixo da cúpula brilhante das noites; no meio dos campos e dos bosques sombreados, no silêncio das florestas, pouco importa; é grande e boa toda causa que, produzindo lágrimas em nossos olhos ou dobrando os nossos joelhos, faz também emergir em nosso coração um hino de amor, um brado de admiração para com a Potência Eterna que guia os nossos passos por entre os abismos.

Seria um erro julgar que tudo podemos obter pela prece, que sua eficácia Implique em desviar as provações inerentes à vida. A lei de imutável justiça não se curva aos nossos caprichos. Os males que desejaríamos afastar de nós são, muitas vezes, a condição necessária do nosso progresso. Se fossem suprimidos, o efeito disso seria tornar estéril a nossa vida. De outro modo, como poderia Deus atender a todos os desejos que os homens exprimem nas suas preces? A maior parte destes seria incapaz de discernir o que convém, o que é proveitoso. Alguns pedem a fortuna, ignorando que esta, dando um vasto campo às suas paixões, seria uma desgraça para eles.

Na prece que diariamente dirige ao Eterno, o sábio não pede que o seu destino seja feliz; não deseja que a dor, as decepções, os revezes lhe sejam afastados. Não! O que ele implora é o conhecimento da Lei para poder melhor cumpri-la; o que ele solicita é o auxílio do Altíssimo, o socorro dos Espíritos benévolos, a fim de suportar dignamente os maus dias. E os bons Espíritos respondem ao seu apelo.
Não procuram desviar o curso da justiça ou entravar a execução dos decretos divinos. Sensíveis aos sofrimentos humanos, que conheceram e suportaram, eles trazem a seus irmãos da Terra a inspiração que os sustém contra as influências materiais; favorecem esses nobres e salutares pensamentos, esses Impulsos do coração que, levando-os para altas regiões, os libertam das tentações e das armadilhas da carne. A prece do sábio, feita com recolhimento profundo, isolada de toda preocupação egoísta, desperta essa Intuição do dever, esse superior sentimento do verdadeiro, do bem e do justo, que o guiam através das dificuldades da existência e o mantêm em comunicação íntima com a grande harmonia universal.
Mas, a Potência Soberana não só representa a justiça; é também a bondade, imensa, infinita e caritativa. Ora, por que não obteríamos por nossas preces tudo o que a bondade pode conciliar com a justiça? Podemos pedir apoio e socorro nas ocasiões de angústia, mas somente Deus pode saber o que é mais conveniente para nós e, na falta daquilo que lhe pedimos, enviarnos-á proteção fluídica e resignação.

Livro Depois da Morte – FEB 
Léon Denis 
Trecho do cap. 51

Nenhum comentário:

Postar um comentário