Vivemos tempos conturbados, onde a aflição toma conta de muitos corações.
Não são poucos a crerem que estamos numa especie de "fim dos tempos", tão alarmantes sejam os noticiários e convulsões sociais. Como espirita, compreendo as problemáticas da vida como transições, transformações, necessárias ao progresso de todos, afinal se somos frutos da Inteligência Suprema, causa primeira de todas as coisas, somos projetos destinados ao sucesso e a felicidade.
Assim sendo, fatal será apenas a melhoria de todos, passo a passo e mesmo dor a dor.
Me lembro de uma canção de Nelson Cavaquinho, chamada Juízo Final, em que sua letra declara:
"O sol....há de brilhar mais uma vez
A luz....há de chegar aos corações
Do mal....será queimada a semente"
O Bem é a força maior que há de imperar sobre todas as calamidades e para melhor refletirmos sobre o assunto, deixamos trecho interessantíssimo do livro A Gênese, de Allan Kardec, abaixo.
Acompanhemos:
Ora, quando o Filho do Homem vier em sua majestade, acompanhado de
todos os anjos, assentar-se-á no trono de sua glória; — e, reunidas à sua frente
todas as nações, Ele separará uns dos outros, como um pastor separa dos bodes
as ovelhas, e colocará à sua direita as ovelhas e à sua esquerda os bodes. — Então,
dirá o Rei aos que estiverem à sua direita: “Vinde a mim, benditos de meu Pai
[...].” (Mateus, 25:31 a 46; O evangelho segundo o espiritismo, cap. XV.)
Tendo que reinar na Terra o bem, necessário é sejam dela excluídos
os Espíritos endurecidos no mal e que possam acarretar-lhe perturbações.
Deus permitiu que eles aí permanecessem o tempo de que
precisavam para se melhorarem; mas, chegado o momento em que, pelo
progresso moral de seus habitantes, o globo terráqueo tem de ascender
na hierarquia dos mundos, interdito será ele, como morada, a encarnados
e desencarnados que não hajam aproveitado os ensinamentos que
uns e outros se achavam em condições de aí receber. Serão exilados para
mundos inferiores, como o foram outrora para a Terra os da raça adâmica, vindo substituí-los Espíritos melhores. Essa separação, a que Jesus
presidirá, é que se acha figurada por estas palavras sobre o juízo final: “Os
bons passarão à minha direita e os maus à minha esquerda.”
A doutrina de um juízo final, único e universal, pondo fim
para sempre à humanidade, repugna à razão, por implicar a inatividade
de Deus, durante a eternidade que precedeu à criação da Terra e durante
a eternidade que se seguirá à sua destruição. Que utilidade teriam então o
Sol, a Lua e as estrelas que, segundo a Gênese, foram feitos para iluminar
o mundo? Causa espanto que tão imensa obra se haja produzido para tão
pouco tempo e a benefício de seres votados de antemão, em sua maioria,
aos suplícios eternos.
Materialmente, a ideia de um julgamento único seria, até certo
ponto, admissível para os que não procuram a razão das coisas, quando se
cria que a humanidade toda se achava concentrada na Terra e que para seus
habitantes fora feito tudo o que o universo contém. É, porém, inadmissível, desde que se sabe que há milhares de milhares de mundos semelhantes,que perpetuam as humanidades pela eternidade em fora e entre os quais a
Terra é dos menos consideráveis, simples ponto imperceptível.
Vê-se, só por este fato, que Jesus tinha razão de declarar a seus discípulos:
“Há muitas coisas que não vos posso dizer, porque não as compreenderíeis”,
dado que o progresso das ciências era indispensável para
uma interpretação legítima de algumas de suas palavras. Certamente, os
apóstolos, Paulo e os primeiros discípulos teriam estabelecido de modo
muito diverso alguns dogmas se tivessem os conhecimentos astronômicos,
geológicos, físicos, químicos, fisiológicos e psicológicos que hoje
possuímos. Daí vem o ter Jesus adiado a completação de seus ensinos e
anunciado que todas as coisas haviam de ser restabelecidas.
Moralmente, um juízo definitivo e sem apelação não se concilia
com a bondade infinita do Criador, que Jesus nos apresenta de contínuo
como um bom Pai, que deixa sempre aberta uma senda para o
arrependimento e que está pronto sempre a estender os braços ao filho
pródigo. Se Jesus entendesse o juízo naquele sentido, desmentiria suas
próprias palavras.
Além disso, se o juízo final houvesse de apanhar de improviso os
homens, em meio de seus trabalhos ordinários, e grávidas as mulheres,
caberia perguntar-se com que fim Deus, que não faz coisa alguma inútil
ou injusta, faria nascessem crianças e criaria almas novas naquele momento
supremo, no termo fatal da humanidade. Seria para submetê-las a
julgamento logo ao saírem do ventre materno, antes de terem consciência
de si mesmas, quando, a outros, milhares de anos foram concedidos para
se inteirarem do que respeita à própria individualidade? Para que lado,
direito ou esquerdo, iriam essas almas, que ainda não são nem boas nem
más e para as quais, no entanto, todos os caminhos de ulterior progresso
se encontrariam desde então fechados, visto que a humanidade não mais
existiria?
Conservem-nas os que se contentam com semelhantes crenças; estão
no seu direito e ninguém nada tem que dizer a isso; mas, não achem
mau que nem toda gente partilhe delas.
O juízo, pelo processo da emigração, conforme ficou explicado
acima, é racional; funda-se na mais rigorosa justiça, visto que
conserva para o Espírito, eternamente, o seu livre-arbítrio; não constitui
privilégio para ninguém; a todas as suas criaturas, sem exceção alguma, concede Deus igual liberdade de ação para progredirem; o próprio aniquilamento
de um mundo, acarretando a destruição do corpo, nenhuma
interrupção ocasionará à marcha progressiva do Espírito. Tais as consequências
da pluralidade dos mundos e da pluralidade das existências.
Segundo essa interpretação, não é exata a qualificação de juízo final,
pois que os Espíritos passam por análogas fieiras a cada renovação
dos mundos por eles habitados, até que atinjam certo grau de perfeição.
Não há, portanto, juízo final propriamente dito, mas juízos gerais em
todas as épocas de renovação parcial ou total da população dos mundos,
por efeito das quais se operam as grandes emigrações e imigrações de
Espíritos.
("A Gênese segundo o Espiritismo", Cap. 17, Predições do Evangelho)
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